08 de abril de 2016

Zoológico de Luján: um relato sincero sobre fascínio e indignação

Argentina, Viagem

Faz muito tempo que queria sentar e escrever sobre a minha experiência no Zoológico de Luján, o famoso zoológico argentino onde você fica cara a cara com leões, tigres, ursos e inúmeros outros animais selvagens sem virar refeição principal do dia.

zoológico de Luján - deixemecontar

Demorei mais de dois anos para fazer isso (minha primeira visita foi em outubro de 2013) porque queria relatar minhas impressões num espaço só meu. Sem barreiras de edição, de sentimentos e, principalmente, de honestidade diante daquilo que se vê nas jaulas do zoológico. Queria fazer um relato sincero, sem hipocrisia e meias palavras. Eis que esse dia chegou e, a partir de agora, você vai conhecer um pouco sobre esse lugar que tanto fascina e gera polêmicas mundo afora.

Cada um com seus motivos

Desde criança, quando os meus pais me levavam a circos ou mini zoológicos, eu me sentia muito, muito triste. Poderia dizer que era devido aos maus tratos com os animais, mas naquela época eu nem fazia ideia de que isso existia. Minha tristeza vinha mesmo por não conseguir enxergá-los devido à minha baixa visão.

zoológico de luján (3)

Sendo assim, nunca me animei com essas coisas de circos e zoológicos. Só que, durante o meu intercâmbio na Argentina, já adulta e consciente das mais diversas atrocidades que acontecem nesses cenários, fui fisgada pela curiosidade de ver todos aqueles animais de pertinho.

zoológico de luján (2)

Não me leve a mal, mas entre a minha conscientização ecológica e a minha oportunidade de enxergar tigres, ursos e leões pela primeira vez na vida, preferi escolher a segunda. E, mesmo não cogitando qualquer possibilidade de voltar, não, não me arrependo do que vi.

Uma indignação para a vida inteira

Quem chega ao enorme zoológico de Luján (distante 58 km de Buenos Aires) pergunta logo pelas jaulas dos tigres e dos leões. Desnecessário, uma vez que as filas para ver esses animais são visivelmente quilométricas.

Chegando lá, aquela euforia entre casais, amigos e pessoas que nunca se viram na vida. “Será que eles são mesmo mansos e domesticados?”. “Será que realmente não vão me atacar?”. “Por que eles não se incomodam com flashes, câmeras e tanta gente chegando e saindo sem parar?”. “Ai, meu Deus, estou com medo!”. “Acho que não vou conseguir entrar…”. “Tá chegando a minha vez!”. “Agora sou eeeeu!”. “Meu Deus do Céu, eu tirei foto com um Leããããao! E ele não me matou!”

zoologico de lujan - leao 1

Lógico que não mataria. Nem a mim nem às milhares de pessoas que passam pelo zoológico desde a década e 1990, das 9h às 16h30, todos os dias do ano. Simplesmente porque não está em suas condições normais de interação selvagem, mas sim visivelmente dopado.

zoologico de lujan - leao 2

Sei que existem várias vertentes para as – infinitas – discussões entre biólogos e veterinários no que diz respeito à “domesticação” dos animais no zoológico de Luján. Sei também que os funcionários e gestores do local garantem que esses animais não são submetidos a quaisquer tipos de droga.

No entanto, responda-me uma coisinha só: o que você, simples mamífero humano domesticado, faria se fosse acordado às 8h da manhã para receber visitas intermináveis, posar para fotos com desconhecidos, ser acariciado por várias pessoas  ao mesmo tempo, ficar com sono, não poder dormir e ainda passar da hora de comer???

Só em ficar com sono e não poder dormir, euzinha aqui já engoliria o primeiro que passasse, com osso e tudo. Imagine um leão!

E, acredite, eles tentam fazer o mesmo. Mas, ao darem os primeiros sinais de estresse e agitação, recebem bebidas e comidas que, “misteriosamente”, fazem com que eles voltem à condição de zumbis.

zoológico de Luján - filhote de leao

Não, nem os filhotes escapam…

zoologico de lujan - tigre branco

Nem o tigre branco…

Não sei explicar direito, mas ficar diante de um leão completamente impotente me deixou arrasada. Eu me senti numa condição verdadeiramente desonesta com a natureza, sabe? E encho os olhos de lágrima só em lembrar.

Não sou bióloga nem veterinária, mas presenciei os funcionários das jaulas pedindo para que muitos esperassem um pouco, pois “os animais estavam agitados, com fome, e precisavam se alimentar”. Uma forma carinhosa de dizer que o efeito “letárgico” passou, né?!

A experiência mais fascinante da minha vida

Depois de me sentir péssima diante do leão, decidi ir à jaula dos tigres. Para mim, os animais mais lindos da natureza.

Na fila, ficava me tremendo mais que vara verde (kkkkk)), pois, na minha cabeça, estaria diante de um gato gigante e vocês sabem: eu tenho um pânico surreal de gatos!

Chegada a minha vez de entrar na jaula, dei de cara com Natália, o animal mais lindo, elegante e charmoso que já vi!

zoologico de lujan - tigresa natalia

Nossos olhares se cruzaram de um jeito tão inexplicável que eu sequer consegui conter as lágrimas. ♥ Fiquei tão emocionada na hora que o cuidador me perguntou se não gostaria de “amamentá-la”. Num surto de loucura e paixão, topei.

Foi a experiência mais fascinante da minha vida! Tanto que, seis meses depois, voltei para reencontrá-la.

zoologico de lujan - tigresa natalia 2

<3

zoologico de lujan - tigresa natalia 3

zoologico de lujan - tigresa natalia 4

Neste dia, descobri que Natália estava grávida! <3

Olhando todas essas fotos, fico ainda mais apaixonada pela perfeição da natureza. E o ser humano se achando tão superior a tudo, né?

Vale a pena visitar o Zoológico de Luján?

Estaria sendo muito hipócrita se dissesse que não. Todo mundo fica fascinado diante da possibilidade de enxergar uma natureza inalcançável. Crianças, jovens, adultos, idosos… impossível não sair do zoológico de Luján com o mínimo de encanto e de emoção nos olhos.

Mas também é impossível não sair indignado com a “rasteira” que se dá nos animais selvagens para que eles possam servir de “decoração” nas nossas lembranças. Imagine só ser condicionado quimicamente a um comportamento que não lhe é genuíno!

Particularmente, não tenho quaisquer pretensões de voltar. Acho a experiência válida, intensa e emocionante para se ter uma vez na vida e só. É aquele tipo de coisa que se guarda com carinho e pronto. Não precisa esbanjar.

Sei que é um assunto difícil e muito polêmico, mas se você está pesando a curiosidade e a consciência ecológica, aqui vai o meu conselho: faça sua escolha com o coração. ♥

Jéssica Vieira
Jéssica Vieira