08 de junho de 2015

Sobre as redes sociais e o preço da corrida contra o anonimato

Crônicas

Sua foto certamente não estampa a capa das mais variadas ‘revistas de fofoca’ do país, mas grande parte dos seus amigos – e não tão amigos assim – sabe exatamente o que você está fazendo agora.

A corrida contra o anonimato nunca foi tão disputada desde o surgimento das redes sociais ou, mais corretamente, redes sócio-virtuais. Tornar-se uma celebridade de sucesso dentre membros de um mesmo espaço virtual virou uma grande disputa na qual o único objetivo, executado de forma sabiamente estratégica, é ganhar a tão sonhada popularidade. Objetivo este não muito diferente do que têm as emergentes celebridades. Entretanto, com um único e significativo diferencial: os anônimos vão, a todo custo, em busca de informações sobre as celebridades. Você, para se tornar uma delas, precisa fornecer informações que despertem a curiosidade de todos os anônimos.

Na página inicial do seu Facebook, “No que você está pensando?” Longe de responder qualquer sacanagem, por favor, a primeira intenção de quem quer se tornar popular é divulgar suas qualidades, mas não aquelas que ‘todo mundo tem’. Quem quer ser popular precisa de diferencial. Afinal de contas, o número de fãs é um dado bastante revelador.

redes sociais - selfie

Como se isso não bastasse, todos devem saber se você fuma, bebe, mora sozinho ou com os pais, qual é a sua altura, se tem tatuagem, o que mais te atrai e, claro, o seu estado civil. Ah, explicar para todos no Facebook, Instagram e Snapchat que você está namorando virou uma prova de amor mais que obrigatória entre os casais. Um cartório virtual para a autenticação do amor, literalmente.

Por falar nisso, quer fazer com que o número de visualizações do seu Facebook suba para a casa das centenas e sua página de recados mostre votos de felicitações? Se estiver solteiro (a), mude seu status para ‘em um relacionamento sério’ (mas não tente fazer o contrário…). Assim como acontece com as celebridades tradicionais, os fãs não resistem a dar ‘uma espiadinha’ e querem saber quem é a sua mais nova companhia. Não, você não DEVE satisfações, você DÁ satisfações. Pontos de popularidade! Não era isso o que você queria?

Bebeu demais na festa de fim de ano e está arrependido? Tarde demais. O mural de fotos dos seus amigos é bem mais convincente que suas próprias palavras e você, lembrando ou não do episódio, em apenas 140 caracteres, descreveu a cena tim-tim por tim-tim.

Mas o preço da popularidade não atinge apenas quem almejou se tornar uma celebridade virtual. As empresas também estão interessadas – e muito – em saber ‘quem é você’ e analisam, cuidadosamente, cada dado, teoricamente pessoal, que é exposto. Um escritório de advocacia, por exemplo, certamente não almeja contratar alguém que diz ter “baixado” o último CD da sua banda favorita, muito menos moças que estampam fotos seminuas em álbuns virtuais ou pessoas que, declaradamente, participam de fóruns do tipo “Eu odeio o meu chefe”.

Dados pessoais não são mais suficientes para preencher os interesses de uma empresa. Ela quer saber mais, sempre mais. Quer seu, Facebook, Twitter, Instagram… Quer saber aquilo que, antes, só você sabia, mas que agora, devido ao advento da popularidade, todos sabem. E se não participar de, pelo menos, uma dessas redes sociais, em que mundo você vive? No anonimato!

Sua foto precisa ser a mais bonita; você precisa fazer coisas interessantes para que tenha ‘seguidores’; sua frase no Whatsapp precisa ser a mais atrativa; suas curtidas em “fan pages” precisam retratar quem você é sem acusar os defeitos que possam te levar a perder uma vaga naquela empresa ou aquela pessoa que está paquerando há meses; você deve ler jornais, revistas, assistir de noticiário a Big Brother Brasil; precisa tomar banho, ir ao trabalho ou à escola; precisa dormir, acordar, ir à academia. Definitivamente, precisa ter um dia com mais de 24 horas – ou fazer de conta que tem – e muita disposição. Caso contrário, ser celebridade não vai passar de um sonho.

Esse é o preço da popularidade que, você, assim como eu, já começou a pagar. Não era isso que a gente tanto queria?

* Texto originalmente publicado em 2011 e adaptado para esta postagem

Jéssica Vieira
Jéssica Vieira